domingo, 25 de fevereiro de 2024

A FOTO DO FÓSFORO DE LÚCIFER

A primeira tentativa de registrar imagens permanentes ocorreu por volta de 1826, quando o inventor francês Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833) conseguiu fixar uma imagem usando uma placa de estanho coberta com betume. Esse processo, conhecido como heliografia, exigia um longo tempo de exposição, chegando a várias horas, e resultava em imagens de baixa resolução.

O avanço decisivo ocorreu em 1839, quando o também francês Louis Daguerre (1787-1851) desenvolveu o processo conhecido como daguerreotipia. Esse método envolvia a exposição de uma placa de cobre revestida com prata ao vapor de iodo, criando uma imagem nítida após um curto período de exposição. O daguerreótipo foi o primeiro processo fotográfico comercializado e ganhou popularidade rapidamente.


Enquanto isso, na Inglaterra, o cientista e matemático William Henry Fox Talbot (1800-1877) desenvolvia outro processo fotográfico, chamado calotipia ou talbotipia. Esse método utilizava papel tratado quimicamente para criar negativos, que podiam ser usados para produzir múltiplas cópias de uma mesma imagem. Esse método foi fundamental para a disseminação da fotografia, permitindo a reprodução de imagens em grande escala.

A fotografia logo se tornou uma nova forma de arte e uma poderosa ferramenta para documentar a história. Fotógrafos pioneiros, como Mathew Brady (1822-1896), registraram imagens icônicas durante a Guerra Civil Americana, revelando ao mundo os horrores do conflito.

Outros, como Eadweard Muybridge (1830-1904), inventor do zoopraxiscópio, exploraram o uso da fotografia para capturar o movimento, abrindo caminho para o desenvolvimento do cinema. Essa palavra é uma junção de três elementos gregos: zoo – que significa “animal”; praxis – que denota “ação, atividade”; e scópio – com significado de “observar” ou “olhar”. O dispositivo foi projetado para estudar o movimento de animais e seres humanos, permitindo que Muybridge capturasse sequências fotográficas de seus movimentos e, em seguida, as exibisse em sucessão rápida. Isso resultou em uma ilusão de movimento, semelhante ao que hoje conhecemos como animação. Com o zoopraxiscópio, Muybridge realizou importantes experimentos que influenciaram profundamente o desenvolvimento da fotografia e do cinema. Suas sequências fotográficas de cavalos em movimento, por exemplo, tiveram um impacto significativo na compreensão da cinética animal e na evolução das técnicas cinematográficas.


Ao longo dos anos, a fotografia continuou a evoluir, com a introdução de novos processos, como o colódio úmido, o gelatino-brometo e, finalmente, a fotografia em película. Essas inovações tornaram a invenção mais acessível e possibilitaram a expansão do jornalismo fotográfico, da fotografia documental e artística.

No final século XX, a fotografia digital surgiu como uma grande e vantajosa revolução tecnológica, substituindo o uso de filme por sensores eletrônicos que capturavam imagens. Isso permitiu o armazenamento, edição e compartilhamento de fotografias de maneira mais rápida e conveniente. Com a popularização dos smartphones e das redes sociais, a fotografia se tornou uma parte intrínseca da cultura contemporânea. Hoje, milhões de fotos são tiradas e compartilhadas diariamente em todo o mundo, registrando momentos significativos e banais da vida cotidiana.

Quanto à origem da palavra, uma ideia une três vocábulos aparentemente distantes: fotografia, fósforo e Lúcifer.

A palavra fotografia tem origem no grego phos (luz) e graphein (marcar, desenhar, registrar). Literalmente, significa “marcar ou registrar com luz”, é a captura de imagens por meio da exposição à luz.

Já o vocábulo fósforo deriva do grego phosphoros, que se referia à Estrela da Manhã, geralmente identificada como o planeta Vênus em sua aparição matutina. O termo é composto por phos (luz) e phoros (portador). Portanto, fósforo significa “portador de luz” ou “aquilo que traz a luz”. Essa palavra também foi associada a materiais químicos que emitem luz quando esfregados ou expostos a uma chama. A palavra semáforo carrega também esse significado de portador de algo: ela tem origem no grego sema (sinal, marca) e phoros (portador), ou seja, é aquilo que porta o sinal (de trânsito).


A palavra Lúcifer, por sua vez, tem origem no latim lucifer, que também significa “aquele que traz/porta a luz”. É formada por lux (luz) e ferre (portar, trazer). Originalmente, “Lúcifer” era o nome dado pelos romanos à Estrela da Manhã, Vênus. Então Fósforo e Lúcifer significam a mesma coisa, mas em línguas diferentes. No contexto bíblico, o nome Lúcifer, por uma tradução feita por São Jerônimo no séc. IV, foi associado a uma figura celestial que caiu em desgraça, citada em Isaías 14:12-15, sendo posteriormente interpretada como uma referência ao Diabo. A palavra em hebraico é helel ben-shachar e significa Estrela da Manhã. Jerônimo traduziu como Lúcifer e depois as pessoas começaram a fazer essa associação com o Diabo.

Será, então, que Augusto dos Anjos, em seu poema Versos íntimos, quando nos diz “Toma um fósforo. Acende teu cigarro! / O beijo, amigo, é a véspera do escarro, / A mão que afaga é a mesma que apedreja”., já sabia que fósforo e Lúcifer têm relação semântica? E que a todo instante recebemos do mundo tanto luzes quanto diabos? E que, então, não haveria mais forma de nos livrarmos dessa sina, senão nos convertermos a algoz de nossos algozes? Por isso, então, ele nos aconselha: “Se alguém causa inda pena a tua chaga, / Apedreja essa mão vil que te afaga, / Escarra nessa boca que te beija!”? Parece que Manuel Bandeira, anos depois, entendeu assim ao afirmar, em seu poema Pneumotórax, que “A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”.


Os verbos levar e portar, presentes nas palavras Lúcifer e fósforo, originam-se de duas bases latinas e uma grega: ferre (fer-) e o particípio latus (lat-, que em português ficou lad- ou laç-); e phoros. Dessas bases, surgiram vários vocábulos em português, como auferir, circunferência, conferir, preferir; colação, delação, dilatar. 


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Jason Lima

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